Seleção e avaliação de líderes
Por Claudiney Fullmann
Edição 09/2010
Em recente viagem à Turquia, conheci a história de um grande líder: Mustafa Kemal Atatürk. O que mais me chamou atenção foi sua missão declarada: “Guerra contra o pensamento medieval e à ignorância”. Procurei conhecer seus feitos para entender mais seu comportamento de líder. Começou na escola, quando um professor lhe atribuiu o segundo nome – Kemal, que significa excelência – por tê-lo avaliado como muito bom em matemática. Fez carreira militar e foi estudar administração política na França, pouco antes da 1ª Guerra Mundial. Comandou o exército otomano e descobriu a traição do sultão Mehemed VI que, para manter seu posto, colaborou com os exércitos aliados que ocuparam o país após sucessivas derrotas.
Liderou então um movimento nacional de resistência contra as forças ocupantes e declarou uma independência completa: econômica, financeira, jurídica, militar e cultural. Proclamou a República da Turquia em 1923 e constituiu a primeira assembleia nacional, que o elegeu como seu primeiro presidente. Opôs-se à soberania de monarca absoluto do império otomano, rompendo com a tradição de 600 anos, abolindo o califado e salvaguardando os interesses das maiorias turcas em solo turco.
Foi um patriota reformista e estadista revolucionário, com conceitos de realismo e pragmatismo. Íntegro, foi contra a corrupção e a decadência da cosmopolita Istambul (antes Constantinopla). Transferiu a capital para Ankara, rejeitando as ideologias comunistas e fascistas da época, impedindo o avanço do governo dos partidos totalitários que tomou conta da União Soviética, Alemanha e Itália e dando estabilidade à nova nação turca. A religião do islã deixou de ser instrumento político, sendo adotado o Estado laico.
Com sua visão de líder, gerou a reforma do sistema educacional, aumentando a taxa de alfabetização, substituiu o alfabeto árabe pelo latino e pessoalmente o ensinava em suas viagens ao interior do país para formar cidadãos responsáveis, frisando que “cultura é a fundação da República Turca”. Carismático, não se preocupou com prestígios pessoais, dedicando-se totalmente ao seu povo, sem demagogia. Dentre muitas reformas para modernizar o país, em apenas 15 anos, implantou também o sobrenome de família, criou leis para o direito das mulheres, estimulou a indumentária no estilo ocidental e proibiu a poligamia dentro de princípios de humanismo declarados em sua visão: “Olho para o mundo com um coração aberto, cheio de sentimentos puros e amizade”. Como reconhecimento, o povo lhe atribuiu o nome Atatürk: Pai dos Turcos.
O exemplo desse líder pode inspirar-nos na avaliação dos líderes políticos, empresariais e de quaisquer organizações. Os resultados de seus atos permanecem em seus liderados por muitas décadas. Um bom líder não trilha um caminho já batido, experimenta outros, procura diferenciais.
Avaliando a liderança de Atatürk e de outros líderes vencedores, podemos identificar alguns talentos essenciais:
- Visão, impulso de realização, panorama positivo e responsabilidade –Quando a visão ou missão é movida por propósitos firmes (e guarda coerência com os valores e crenças), o líder torna-se forte, capaz e efetivo. As pessoas adoram os empreendedores – indivíduos que exibem a chama da paixão e da convicção à medida que avançam na direção de causas e objetivos vigorosos. O impulso de realização nasce do desejo, é a qualidade de exibir compromisso firme e persistência voltados à realização de metas. Onde há esse impulso – individual, corporativo ou de toda a nação – a produtividade e a prosperidade são elevadas. As ações do líder guiam-se sempre por um panorama positivo, pela crença íntima de que a boa vontade prevalecerá acima de tudo e pela certeza da vitória, de que as metas serão atingidas. É a fé subconsciente no sucesso e a disposição para tomar a iniciativa e arcar com toda a responsabilidade pelos resultados.
Encontramos ainda no âmago do líder:
- Caráter, carisma e estabilidade emocional – É o somatório dos ideais, valores, experiências, conhecimentos e sabedoria. É dizer a verdade quando seria mais popular ou lucrativo mentir. O caráter é a natureza na sua forma mais elevada, enquanto o carisma é a qualidade cativante que faz as pessoas gostarem de nós ou nos respeitar, querendo nos imitar. É energia. Vem da certeza que o líder tem de que sua postura e crenças são corretas. É o espírito de uma pessoa que irradia esperança, consideração, confiança, amor, entusiasmo e alta expectativa pelas outras pessoas. Um líder vencedor mantém o nível emocional inalterado ao enfrentar as ondas trazidas pelos altos e baixos da vida e acredita que poderá ganhar experiência em ambas as situações. É equilíbrio, firmeza e maturidade.
Em toda jornada de liderança, são necessárias habilidades passíveis de serem aprendidas:
- Planejamento, capacidade de decisão, delegação, tolerância à ambiguidade e talento social – Um bom líder tem de ser competente para delinear planos com clareza e organizar gente e recursos para realizá-los, ser capaz de manter o equilíbrio entre planejamento e execução. Saber como e por que planejar e quando e como agir. Decidir rapidamente após avaliar situações, analisar alternativas e rumos para a execução dos objetivos. Lembrar que ninguém segue uma pessoa que é fraca e insegura para tomar decisões e assumir riscos. Saber designar projetos para pessoas competentes e responsáveis e acompanhá-las, revendo regularmente o desempenho delas. Somente por meio da delegação é que um líder conseguirá multiplicar-se e realizar mais por meio de gente. Tolerar a ambiguidade significa saber enfrentar momentos de estresse, desapontamentos, obstáculos e frustrações enquanto progride, sem se deixar abalar e sem perder de vista suas metas. Com o talento social, vem a habilidade de tratar de diversos problemas ao mesmo tempo sem perder o foco, o propósito e o autocontrole. Para isso, o líder precisa saber ouvir, entender e reagir com serenidade às diferentes situações envolvendo gente.
E aqui vem a pergunta mais complexa: como selecionar tais líderes? As avaliações anteriores definem os parâmetros da seleção enquanto indagamos: o que se espera do líder a ser escolhido?
As entrevistas são insuficientes porque muitos respondem o que já elaboraram, não respondendo à pergunta específica. As dinâmicas ajudam mais por conter elementos surpresa que requerem reações intrínsecas, inusitadas, por exemplo as observadas nos outdoor learnings (metodologia que fixa a aprendizagem por meio da vivência e da experiência) como o Desafio das Mudanças, da Educator, que tem o propósito de formar equipes e detectar potenciais de liderança.
Conhecer seus alicerces comportamentais permite uma avaliação prévia que só pode ser comprovada na prática, no dia a dia, nos momentos inesperados.
A necessidade atual é de pessoas capazes de enxergar problemas antecipadamente e sob ângulos não convencionais. Buscam-se líderes competentes para resolver problemas novos. Uma boa bagagem de experiência, aliada ao dinamismo e à criatividade, é requisito essencial para quem mostra vontade de superar obstáculos.
Desafio é o combustível da liderança!