Sabedoria

Sabedoria

 

Por Claudiney Fullmann

Edição 02/2011

 

“O saber não ocupa lugar”, dizia minha avó, mantendo a antiga sabedoria que remonta ao rei Salomão. Os saberes diferenciam as pessoas e as tornam admiráveis pelos simples saber fazer, saber ter e saber ser. Hoje, é comum dizer que as pessoas precisam ter CHA – Conhecimentos, Habilidades e Atitudes. Os conceitos se assemelham.

Saber fazer – A descoberta do conhecimento

Desde pequenos, aprendemos a fazer alguma coisa. A curiosidade infantil acumula conhecimentos de como as coisas funcionam, das relações de causa e efeito, do certo e errado, das alegrias e tristezas. Desse conjunto de experiências, aprendemos a fazer aquilo que nos deixa mais felizes. Essa etapa vai se desenvolvendo na adolescência e se consolida na fase adulta, quando as carreiras profissionais priorizam o que se gosta de fazer. Os dons, os talentos e as descobertas formam nossas competências, tornando nossos desempenhos naturais, sem esforço especial, e aprimoram as habilidades.

Sabemos fazer algumas coisas com mais elegância, velocidade e qualidade que algumas pessoas. Há outras atividades em que reconhecemos nossas limitações – sabedoria essa que facilita o trabalho em equipe. Tais predicados são valorizados tanto profissional quanto pessoalmente.

Os empreendedores iniciam seus negócios com base no somatório dessas energias acumuladas, assegurando um potencial de sucesso e riqueza.

Saber ter –A habilidade da conquista

Como resultado do saber anterior, as pessoas passam a ter desejos de possuir mais, de crescer, de ir além – o que é muito salutar. Alguns, mais afortunados, podem até obter muitas coisas com pequeno esforço de conquista, mas correm o risco de perder o que têm por não saber o que fazer com o patrimônio conquistado ou o legado deixado pelos pais.

De qualquer maneira, o sentimento de posse é muito forte até nos animais. Experimente tirar um osso da boca de um cachorro, que até o enterra para não deixar que outros se apoderem dele, mesmo depois de satisfeito. O ser humano, então, tem a tendência de ser egoísta. Se uma criança não aprender a compartilhar seu brinquedo com as outras, dificilmente será altruísta quando adulto.

Na hierarquia das necessidades de Maslow, “ter” é sinônimo de status. Nada de errado em possuir algo quando ele é fruto do saber fazer honesto, com a aplicação das habilidades progressivamente aprimoradas. Saber ter não pressupõe arrogância e menosprezo aos menos favorecidos.

Considerando que nascemos sem nada ter, e que morreremos sem levar coisa alguma, devemos valorizar muito o saber ter. Possuir para quê? Se o que temos, sejam bens materiais, talentos ou conhecimentos, não servir para a evolução da humanidade, passaremos pela vida sem méritos. Precisamos saber ter e compartilhar. Quando partirmos, sobrarão apenas os tesouros guardados nas pessoas com quem convivemos – os amigos, os colegas, os que amamos e ajudamos – todos aqueles que viram nosso desprendimento com as coisas materiais.

Saber ser –O equilíbrio da sabedoria

Esse saber está intimamente alinhado com as atitudes. Saber fazer as coisas eficazmente, com seus conhecimentos e habilidades, e saber ter bens materiais como consequência não garantem a qualidade de saber ser. Nessa sabedoria estão os quesitos de educação, humanidade, respeito e amor ao próximo e à natureza, simpatia e até uma dose de humildade. Não raro, encontram-se profissionais competentes, habilidosos em fazer o que sabem, mas que são rudes no trato com as pessoas que o cercam e o servem. Muitos são odiados por sua forma de ser, embora respeitados por seus conhecimentos e habilidades.

O saber ser espelha o caráter. Alguns que sabem fazer determinado trabalho, e que estão voltados a processos e resultados e têm o poder de mandar, orientados por reconhecimento e segurança em suas posições, às vezes, negligenciam a necessidade de saber ser com as outras pessoas.

Quem sabe ser certamente saberá fazer e ter com galhardia. Movido pela vontade de ser alguém melhor, sem precisar rebaixar ninguém, sem orgulho nem presunção, a pessoa não terá limites de crescimento e arrastará consigo os indivíduos que se identificarem com seus propósitos e valores. Pessoas trabalhando juntas conseguem mais e melhores resultados globais que a soma dos resultados individuais. Os sábios que aglutinam esses três saberes também sabem ser líderes vencedores.

Sabedoria dos líderes

Sempre provoco as pessoas com a pergunta sobre a diferença entre o esperto e o sábio. Respondo, então: “O esperto aprende com seus próprios erros e o sábio com os dos outros”. Mas não é fácil ser sábio. Quantas vezes alguém falou para seu filho não colocar a mão no fogo porque isso queima, machuca e dói? Mas a criança só ficará esperta depois que experimentar a queimadura. Em aconselhamentos, às vezes como coach ou mentor, apontar erros sem uma lógica irrefutável parece estimular mais a pessoa a trilhar o caminho torto. Muitas vezes, é preciso deixá-la errar um pouquinho, ficando por perto e vigilante, pronto para socorrê-la do desastre.

Ensinar o saber fazer parece ser o mais fácil. Todo líder precisa ter o ensinar como foco de sua liderança e ser orientador de seus subordinados para que extraiam o melhor de si com a felicidade e o prazer de trabalhar. Como no conhecido ditado: “Em vez de dar o peixe, é preferível ensinar a pescar”. Essa é a maneira clássica de transferir o know-how. O outro vai saber fazer com o método de quem o transferiu. Dependendo do grau de interesse do aprendiz, isso é suficiente. Entretanto, se ele tiver uma visão mais abrangente, será necessário apresentar-lhe o know-why e a pessoa entenderá o porquê da coisa, não somente o como. Assim, o saber fazer descortina melhores métodos – mais compatíveis com suas necessidades e seus recursos.

Saber compartilhar experiências, acertos e erros é ter a virtude de se manter superior sem nada perder. Faço uma analogia com o óleo na superfície de um copo-d’água: quanto mais água o líder colocar em seu copo, mais ele subirá pelas forças que vêm de baixo.

Outra virtude dos líderes é saber identificar as pessoas competentes para cada situação. Certas pessoas sabem fazer coisas mais habilmente que outras – são talentos naturais extravasados com alegria. Essas mesmas pessoas podem não se sair tão bem em outras atividades ou situações. Preserve-as, outras serão melhores. Saber lidar com a diversidade de talentos torna um ambiente cooperativo com menos estrelismos e melhores resultados.

Saber ter e saber ser são transferidos para a equipe de liderados pelo exemplo, e não pelo discurso. As atitudes do líder são observadas silenciosamente em todos os momentos, não apenas na relação direta com as pessoas. A serenidade com que enfrenta situações inesperadas e o regozijo pelas vitórias conquistadas com o esforço conjunto, com elogios sinceros, marcam profundamente a mente dos observadores.

Líderes vencedores serão sempre lembrados pelo que souberam ou sabem fazer, ter e ser e pela liderança emocional impactante.

Por fim, lembro-me de um cartaz visto em uma oficina mecânica: “Ó Deus, dá-me sabedoria para entender meu chefe (vale também para o subordinado) porque, se me deres força, eu bato nele”.